Sexta-feira, 18 de Março de 2005

para TI

O mundo está aí,
É agora.
Será sempre mundo.
É um estranho
Dentro e fora de ti e de nós,
Indizível,
Inexplicável.
É uma pena.

Há apenas uma esferográfica
Nos dedos indecisos de um poeta vazio.
Uma folha branca
Onde nada está ainda dito.
E há uma dor diferente de todas as outras,
Inominável.
Uma dor que gera um constrangimento sem significado,
Que me cala o poder dizer-te:
Vês, é um buraco.
Não há lá nada agora.
É tudo.

Tem apenas cuidado!
Se há uma ferida tua no mundo,
Porque há o deixar-nos perder
Na guerra dos mundos.
Na tendência das opiniões.
Tudo para um lado ou para o outro.
A questão da higiene,
Do não-espanto,
As coisas pequenas,
Os nossos dias.

Por isso, nunca te esqueças de Parménides
Nem tenhas medo de ti
Ou das tuas perguntas.
Tenta sempre resolver todos os equívocos
Que se possam gerar no vazio que há também à volta do buraco.
O futuro.
Porque havendo a história dos dias que passaram,
Há também os dias que ainda não vieram.
Todos os dias são estrangeiros quando começam.
Tal como tu e eu nos tornamos estranhos.
Os dias são estranhos que apelam por um refúgio em ti e em mim.
Os dias esperam uma resposta clara.

E nunca te esqueças que há um estar somente no mundo
Que somos todos muito pequenos.
Não te apropries de nada.
Nem queiras lucrar com os teus esforços extraordinários.
O trabalho é apenas trabalho.
Não te domicilies na ideia de posse de uma casa,
Não queiras ter um remetente ou uma morada só teus.
Está certo não te rodeares de coisas que não são tuas
Não são minhas.
No limite, não são de ninguém.
Nunca pares.

Eu sei que é difícil,
Pois isto é o mundo,
Um lugar onde existem paradoxos megáricos.
Lembras-te?
Nós estávamos mergulhados na dúvida gerada,
Como se um mentiroso se tivesse confessado a nós,
E nós não soubéssemos como acreditar.
Mesmo que agora a saudade te faça querer voltar atrás,
Isso vai ser violar o tempo
Uma lei Irreversível.
Mas inevitavelmente confrontar-te-ás novamente com a dúvida,
O tempo dos megáricos,
E cairás na mesma tentação de pensar que te menti.
Porque não demos um lugar às nossas coisas.
As nossas coisas não podem tornar-se mais importantes que o mundo.

No mundo existem milhares de lugares,
Onde existem também coisas feias e bonitas.
Onde há pedras e flores.
Onde há outras coisas que não são pedras nem flores.
Onde se arrisca fazer pontes entre todos os lugares.
E toda a gente fica espantada.
No mundo também se arrisca desfazer.
Muitas vezes não se arrisca.

Por mais que te esforces e que eu me esforce,
Acabamos por não saber mais nada.
Mas foi contigo que aprendi tudo.
Que não se pode voltar atrás.
Que os nossos erros não se apagam.
Que erramos depois de errarmos.
Que ambos nos sentimos sempre encurralados e perdidos
No meio da folha branca que nos separa.
Um lugar onde nos sentimos sós
Sem nos apercebemos de nada.
Nem sequer acerca da brancura falamos alguma coisa.
Acontece que ainda não sabíamos que éramos quem éramos,
Quase nada.
E que a vida é assim, bela.
Apesar de nada estar escrito.

Por isso, nunca te entregues a algo fácil.
Nem te afastes de ti nunca.
Apesar de tudo, lembra-te.
Mesmo que estejas ou vás estar longe,
Recorda-te que há outras coisas além de ti.
Há o mundo.
Há uma utopia
Onde somos todos irmãos que te chamam camarada.
E camaradas que nunca te trairão
Antes do virar da página.

Pode ser que haja uma coisa bonita num lugar suspeito.
Por exemplo, uma pedra.
Pode ser que haja uma pedra pequena que sente e que chora.
Tu sabes em que se despedaça uma pedra?
As pedras que se despedaçam
Transformam-se em areia.
Que a areia é quase como a água que seca num rio.
Sim,
Há rios que não vão dar ao mar.

fernando

publicado por ... às 23:36
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Domingo, 13 de Março de 2005

Uma tomada de posse sem beija-mão e quase sem mulheres.

Sem parágrafos, ficamos a saber que Sócrates gosta de Freitas do Amaral, tanto quanto gosta de António Costa, a serem verdadeiras as imagens difundidas. Bem, talvez goste mais de Freitas do Amaral, que também não gosta de parágrafos quando muda de assunto. É como se fosse sempre o mesmo, mesmo quando não é. Socrates passou mais tempo a falar com ele, quase sempre de costas para António Costa, em certos momentos. Quando se gosta duma pessoa fala-se com ela, olha-se para ela, e procura-se estar ao lado dela o tempo todo. Viu-se qualquer coisa de profundamente errado ali. Foi isso que aconteceu durante a tomada de posse do novo executivo, de significativo.
Ficamos a saber que, de qualquer forma, aqueles são os dois únicos homens com permissão para falar por conta própria. Embora Freitas do Amaral tenha uma espécie de prioridade. Foi isso que aconteceu depois da cerimónia. Freitas do Amaral foi o único que falou. Disse que o seu ministério terá «três grandes prioridades. Em Portugal, estão definidas há trinta anos. A Europa, as relações transatlânticas e os países lusófonos». Foi isto que disse aos jornalistas à saída do Palácio da Ajuda, depois da posse do executivo. Freitas do Amaral disse ainda que nunca comparou o presidente norte-americano a Hitler e lamentou que essa ideia tenha passado para a opinião pública. Presumivelmente irá fazer as pazes com Bush, como fez com África, com a Europa, com Soares. Porque teve sempre algo em troca, algo que resulta sempre e sempre num benefício pessoal. A sua sobrevivência e a sua gordura sorridente e católica serão ainda maiores. Ah, o tal currículo que, segundo o principal ideólogo da direita, é um dos dez melhores. Que terá agora como prenda?
Ficamos também a saber que as mulheres socialistas se indignaram com as declarações de Sócrates. Segundo este, não há no PS mulheres suficientemente preparadas a nível político e técnico para integrarem um governo socialista. De facto, há um défice feminino no Governo, onde há somente duas mulheres. Sócrates disse que as mulheres «não sabiam a dificuldade que é formar um Governo». Este não é tão amigo das mulheres quanto o Sócrates grego.
Também soubemos que não houve beija-mão e que o anterior governo, que não tinha sido eleito, ficou sentado na primeira fila até ao fim, a vê-los passar. Pela primeira vez uma coisa destas aconteceu. Mais um castigo para o governo cessante e também mais um castigo para os parolos que gostam destas coisas de apertar a mão a um político. O tal "Portugal das oportunidades", a que se referia o agora primeiro-ministro, se calhar acabou antes de começar. Até a uma próxima oportunidade.

fernando

publicado por ... às 02:22
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Quinta-feira, 10 de Março de 2005

O PS adoptará uma política de direita

Engraçadíssimo. As pessoas não sabem que política adoptará o PS. Um governo com ministros de todas as cores. Resta saber para onde cairá o pêndulo. Globalmente.
Já vimos que este PS é um compromisso entre o PS soarista, depois de ser metido na gaveta, e o PS guterrista. Estão lá os símbolos de ambos, todos os símbolos. O punho fechado, que simboliza a força, a indignação e a revolta da classe mais desfavorecida. E está lá a rosa, que não significa nada, além de um certo encantamento e aroma. Isto não é não gostar de flores. O problema é a metáfora política, o pântano associado a ela. Possivelmente há flores num pântano, mas não rosas.
Sim, é evidente que a intenção inicial não era essa. O cravo tem outro significado, teve. Também foi ultrajado. As pessoas começam a ter vergonha de aparecerem de cravo na mão. Talvez já não sintam a metáfora, e desconheçam até. Foi há muito tempo, 30 anos. Da mesma forma, já ninguém canta a Grândola Vila Morena sem se enganar ou esquecer. Já ninguém canta quase. É aí que a "metáfora viva" dá lugar à metáfora morta, usando uma expressão de Paul Ricoeur, aqui deslocada.
E é aí que está tudo a morrer, a verdade, a transparência de que fala o BE, a esperança, a confiança, a credibilidade, a responsabilidade, o rigor, a estabilidade, a coerência, a diferença entre a esquerda e a direita, alguns famosos, o Papa e até o Fidel Castro.

fernando

publicado por ... às 20:58
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Sábado, 5 de Março de 2005

PS: um partido de alterne político

Finalmente apareceu Sócrates, agora sem Vitorino. Talvez porque este será candidato a presidente da república. Este PS irá fazer tudo para que Vitorino seja eleito. Irá acabar de vender-se. Não só o PS. Todos aqueles que, à semelhança de Freitas do Amaral, querendo permanecer na ribalta, só não renunciam à sua ideologia ao Domingo de manhã. Querem permanecer na ribalta, como se tivessem eternamente direito a ela, como se ela lhes tivesse sido prometida por Deus para sempre. Não hesitam em mentir à sua volta. São as rolhas da esquerda, que retiram todo o carácter que restava à esquerda. Fogem à menor dificuldade, sobretudo quando o pântano que criaram se prepara para os engolir. E é por isso que, mais uma vez, não há grandes novidades. Tudo continua a mesma coisa. Os oportunistas conseguem o que querem. Fora isso, há um repúblico pretensamente de esquerda no governo, o que já não é mau de todo. Pretensamente, porque esta é também pretensamente ainda a época da suspeita e da incerteza, o que é a mesma coisa.
A esquerda parece aceitar este jogo, que se consubstancia no tal centro, teorizado pelo afilhado do Marcelo Caetano, que toda a gente ouve doze horas depois da missa, sem questionar, como se tratasse do padre que os acalmou de manhã. Uma boa forma de acabar o dia, em paz. Há alguém que os compreende de manhã à noite. Alguém que tenta explicar as vantagens da fé e de comer fora à sexta e ao sábado. Fala para todos aqueles que renunciaram às ideias que englobavam também os outros, que nunca tiveram coragem de defenderem sozinhos uma ideia de comunidade. Fala também para aqueles que nunca tiveram uma ideia para nada. Fala para aqueles que trocaram tudo por um pouco mais de dinheiro e de reconhecimento dos outros, por um contrato de trabalho mais vantajoso, mas que sabem que nunca mereceram.
A esquerda parece sentir-se atraída por essa plêiade de oportunistas que só pensam em si próprios, que nunca arriscaram uma palavra ou uma ideia além do egoísmo silencioso por que pautam a sua existência no mundo. Permanecem em silêncio de forma calculada, olhando apenas os pratos da balança. Calculam o momento certo de saltarem fora ou dentro sem pensarem nunca na questão da ética e da justiça. São como ratos que abandonam um barco, apenas querem manter o emprego, acabar de pagar o empréstimo da casa e o carro, ter direito a férias, manter os filhos num colégio privado. Os outros que se lixem.
E talvez este seja o grande desafio da esquerda hoje, saber quem no seu seio tem uma utopia de esquerda. O caminho está a ser metodologicamente traçado para que no futuro não possa haver distinção entre partidos. E restará apenas a diferença de serem mais que um partido, que se vão alternando no poder. Partidos de alterne que se prostituem sem embaraço.
A esquerda jamais poderá ir por aí, por esse caminho que eles indicam com os olhos ternos e doces, com os braços estendidos, aos domingos. Não podemos cruzar os braços perante aqueles cuja única glória consiste em criar um abismo entre nós e um mundo mais justo. Para que existam pessoas que não se arrastam, para que não haja pessoas que seguem o vento em vez de seguirem o seu próprio caminho, é necessária mais um pouco de coragem. Mesmo que longo, difícil e cheio de obstáculos, o caminho a percorrer não é o mesmo caminho pantanoso que nos indicam na homilia. A utopia é aquela ideia clara que se levanta sempre que a tentam derrubar, é uma ideia que corre, grita, luta, expõe o seu sangue. Não podemos ser aqueles que se tornaram velhos sem terem uma história de coragem para contar aos jovens. Não podemos ter medo do abismo que nos rodeia, que nos cerca em dado momento. Sejamos loucos.

fernando

publicado por ... às 18:24
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Quarta-feira, 2 de Março de 2005

O que é a inteligência?

"Tamanho do cérebro dita muito do insucesso escolar", foi assim que um estudo efectuado no Departamento de Antropologia da Universidade de Coimbra brindou toda a gente com o atroz regresso do geneticismo, encontrando uma relação entre perímetros cefálicos maiores nos rapazes e boas notas. O sucesso como uma dependência de factores genéticos. Mas a grande questão será responder primeiro a uma pergunta basilar, o que é a inteligência? E ninguém sabe o que é. Há quem diga até que há agora uma inteligência chamada emocional, que sempre houve.
Acontece também que esta investigação não teve em conta o facto de pessoas vivas não serem pessoas mortas. Uma pessoa não é um osso. As pessoas vivas são muito mais complexas que as pessoas mortas, e o número das variáveis tornam-se imensas.
Não chega debruçaram-se sobre as médias de dez disciplinas de alunos da Escola Básica 2/3 Guilherme Stephens, da Marinha Grande, ou o facto de a maioria dos pais pertencer ao mesmo estrato social. Como se tentando controlar a influência das variáveis externas, colocando todos os alunos em condições semelhantes, seleccionado apenas jovens que nasceram com mais de 2500 gramas, amamentados a leite materno, pertencentes a famílias biparentais, dextros, sem disléxia e sem problemas de visão, elas fossem realmente controladas.
Analisaram-se também as médias do 1º período, altura em que "não há ainda pressões sobre os professores para passar os alunos", explica Hamilton Correia. O que é interessante aqui, é ver até que ponto o investigador ignora os motivos pelos quais os professores avaliam os alunos, que cada vez mais tem menos a ver com o seu desempenho escolar. Terá avaliado também a inteligência dos professores? E mais importante que isso, a sua própria inteligência?
O passo seguinte foi medir a estatura e o perímetro cefálico dos jovens. Até se concluir que, sobretudo nos rapazes, os de maior perímetro cefálico eram os de notas mais elevadas. Que grande estupidez...

fernando



publicado por ... às 03:25
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